domingo, 14 de outubro de 2012

Playtest no Encontro Mensal de rpg de Lisboa

Ontem tive oportunidade de testar o jogo, durante o Encontro Mensal de rpg de Lisboa, graças à boa vontade do Sérgio Mascarenhas, do Henrique Bruno Soares, da Susana Mourão, do Henrique Samii e do João Mariano.

Não estava à espera de ter tantos jogadores, por isso perdemos um pouco de tempo a fazer mais duas personagens; o Sérgio Mascarenhas surpreendeu tudo e todos ao fazer uma Sombra de Fogo, apropriadamente da Esfera de Fogo, e que lhe pedi depois que me enviasse mais informações sobre esta Esfera e suas culturas.

O jogo começou lento, com os jogadores a ambientarem-se uns aos outros e ao próprio jogo, mas a entrar rapidamente no espírito. Quando chegámos à altura de testar as regras de Conflito, a impressão imediata que tive foi que as regras resistiriam, mas que não perdiam em ser um pouco mais sólidas. O Sérgio Mascarenhas foi um porreiro ao apontar potenciais falhas e sugerir melhoramentos.

Quando à história do jogo, não avançámos muito: tivemos muitas paragens, e no fim perdemo-nos um pouco em conversas paralelas, de modo que foi melhor para a coisa e deixar para uma segunda oportunidade. Tentei homenagear o Clive Barker e o H.P. Lovecraft, mas o cenário que tinha idealizado, um feiticeiro que se auto-mutila para potenciar um ritual que chamasse os outros Aetherplastas, ao mesmo tempo dando-lhes um mapa na forma da sua pele ressequida onde as feridas se movimentam e agregam para formar as indicações para as várias Esferas onde possam investigar a razão da sua chamada, mas percebi que é uma ideia demasiado extensa para um one-shot; é uma para uma mini campanha, e talvez a inclua num cenário inicial.

Mesmo que não tenhamos terminado, gostei muito da interacção dos jogadores entre si, da maneira como usaram as Condições, como rapidamente criavam novas Chaves de Cenário, e como usavam a Regra de Drama para potenciar o Conflito, até entre si; a Regra do Karma é que me pareceu dificil de assimilar, e é preciso revê-la (e mudar-lhe o nome: Regra da Influência parece mais apropriado).

Um bom dia de rpg. O meu muito obrigado a todos!

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Aetheroplastia

Chego à publicação que é o cerne de todo o jogo; quis começar por endereçar primeiro a parte dos Conflitos, porque era a que estava melhor estabelecida na minha cabeça, e fui pensando ao longo dos tempos na maneira como queria que a Aetheroplastia funcionasse, tanto em termos mecânicos como visuais; ajuda que todas as mecânicas andem à volta das Chaves, que é um conceito bastante fluido e elegante, e também ajuda que seja necessário ao Aetheroplasta ter uma lâmina e os braços livres para manipular a realidade - quando digo lâmina, não falo apenas em facas: lanças, espadas de dois metros, machados, um pedaço de vidro que corta a mão do utilizador ao mesmo tempo que corta o tecido da realidade - tudo funciona, e dá um ar muito giro e diferente, se um Aetheroplasta tiver uma faca com gestos curtos e simples, e outro tiver uma lança e efectuar uma dança complexa com gestos largos e harmoniosos.


Para efeitos narrativos, a Aetheroplastia tem sempre um ar de algo que está mal, de algo de muito errado que vai acontecer, que provoca desconforto, não só no utilizador mas também nas pessoas à sua volta. Mesmo nos efeitos mais simples e quando o Aetheroplasta se sacrifica de corpo e mente para evitar a propagação do Éter, existe sempre um murmúrio de loucura, uma vela que se apaga num quarto fechado, um cheiro nauseabundo, o chão coberto com pássaros mortos, larvas que se contorcem por baixo da pele, insectos que tentam entrar nas narinas e boca, barulhos de ratos nas paredes, mesmo que não haja paredes!, ou algum outro efeito perturbador. Nos efeitos de maior alcance este desconforto é ainda maior e torna-se físico, transbordante ou opressivo, e às vezes tudo ao mesmo tempo, aos olhos do Aetheroplasta as pessoas tomam formas indescritíveis, os seus corpos tornam-se deformados, errados. Esta sensação é suficiente para levar o praticante à loucura, embora os Arautos, que muitas vezes fazem pactos com as criaturas e ultra-deuses do Éter, consigam, em aparência, suportar tudo isso, e os Arrebatados já ouvem vozes regularmente e por isso não fazem distinção.

Tal como falei na publicação sobre Loucura, existem quatro "graus" para a Aetheroplastia, e o artesão deve ter sempre um sacríficio para que esta resulte, seja um sacrifício pessoal, mental ou físico, seja um sacrifício mais egoísta, que derrame o Éter na realidade onde é praticado. Estes graus são usados unicamente para apresentar uma diferença entre magia e Aetheroplastia.

Os dois primeiros graus são equivalentes em efeito e alcance à magia normal, e podem seguir-se as linhas para gerar efeitos tal como apresento aqui, mas têm automaticamente Vantagem se confrontados com magia do mesmo grau; ou seja, um Aetheroplasta que tente lançar uma bola de energia, um efeito Mundano e Temporário, contra um mágico que tente responder com uma bola de fogo, também um efeito Mundano e Temporário, sairá sempre na mó de cima. Estes graus tratam de efeitos que afetam unicamente o tempo e o local da Esfera onde são praticados, e ultrapassam mesmo as limitações e características de cada Esfera. A este nível os efeitos são de alteração física própria e de terceiros, como espigões ósseos, crescimento monstruoso, ou tentáculos com farpas para agarrar, ou feitiços de controlo mental através da loucura, feitiços de utilidade como ver através dos olhos de animais, fazer chover sangue, ou mover-se através das sombras.

Os dois graus seguintes tratam de efeitos com um alcance superior, extra-Esfera ou extra-Tempo.

O terceiro grau deixa o utilizador trabalhar e manipular a realidade da Esfera Planar onde se encontra, mas tem efeitos igualmente horríficos, como vomitar monstros que ajudem em combate, destilar pesadelos em forma física, ou ainda efeitos temporais menores, que ajudem o Aetherplasta em Conflitos, fazendo-o prever as ações dos oponentes e viajar um segundo para o passado, ou redirecionando Condições para o adversário, ou ainda golpear o oponente de forma que a realidade à sua volta se quebre e ele deixe de existir no consciente colectivo e nas memórias das pessoas.

O quarto grau é o mais poderoso e perigoso de exercer, pois permite lidar diretamente com várias dimensões ao mesmo tempo. O Aetherplasta pode parar um continente no tempo, fazendo o resto do mundo continuar a girar, pode transportar um país para um mundo diferente noutra Esfera, pode infectar uma ou mais Esferas com um vírus que torna todas as pessoas em insectos humanos, pode matar todos os membros do sexo masculino num planeta, pode trocar um tipo de árvores de um planeta por outro noutra Esfera. De recordar que este tipo de efeitos atrai sempre a atenção de algo no Éter: os hiper-deuses estão sempre à espreita.

Futuramente, planeio publicar um artigo sobre como gerar estes efeitos; para já, e antes do teste de jogo, é-me suficiente ter uma ideia mais assente sobre o tipo de coisas que se podem fazer. Não estou casado com a ideia dos graus, e estes podem ainda desaparecer. Os hiper-deuses são uma homenagem nada velada ao Lovecraft; em calhando, ainda vou mexer no artigo sobre as Esferas para indicar que os vários mundos nas várias Esferas têm religiões diferentes, algumas mono- outras politeístas, algumas animistas, algumas ateístas, e que no Éter existem seres que estão ao mesmo tempo acima e fora de tudo isso; e também que no mundo Zhentau existe uma biblioteca que se supõe ter sutras sobre estes seres, do tempo que em ainda havia Harmonia.

E, claro, num mundo perfeito, o Aetherplasta seria desenhado pelo Mike Mignola.


quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Loucura

Este é capaz de ser um dos posts mais difíceis de escrever, e por isso está a demorar tanto tempo; não só tem carradas de coisas que lhe estão ligadas, como a Aetheroplastia e o Éter, por exemplo, como também é o ponto de viragem no Aetheroplasta, onde deixa de ser um simples Everway-wannabee e passa a ter identidade própria; por outro lado, é extremamente difícil de conjugar a loucura dimensional e incompreensível de Lovecraft com a loucura pessoal e humana de Barker.

Por isso dividi as Chaves Mentais, refletindo a influência de Barker, e Chaves Inenarráveis, para mostrar a influência de Lovecraft, em vez de lhes chamar simplesmente Chaves de Loucura; no entanto, é de notar que ambas estão intimamente ligadas entre si.


As Chaves Mentais, como indico na publicação sobre Chaves, definem as características mentais do personagem e e medem a sua descida à loucura.

Cada Aetherplasta tem uma ou mais Chaves Mentais que refletem os seus desejos, as suas paixões e/ou os seus medos; estas Chaves podem ser Mundanas, que representa uma vontade, ou Superiores, para mostrar uma obsessão, mas as iniciais serão sempre Permanentes. Durante o jogo o personagem pode apanhar outras Chaves Mentais Temporárias, para refletir o seu estado emocional, e estas podem desaparecer ou tornar-se Permanentes.

Num Conflito o jogador pode usar uma destas Chaves para tentar ganhar Vantagem, tal como normalmente usará uma Chave qualquer, e deve refletir o seu roleplay e descrição da ação de acordo com a Chave e sua importância; no entanto, a descrição do uso da Chave deve ser progressivamente mais horrível e mais desumano, e isto é particularmente importante se a Chave for Superior. O Aetherplasta pode tornar-se cada vez mais sádico, infligindo dor e sofrimento atrozes aos seus inimigos de maneiras progressivamente mais monstruosas; ou o Aetherplasta pode tornar-se masoquista ao ponto de procurar dor física em conflitos, expondo-se cada vez mais aos golpes; ou pode abraçar a sua obsessão a um ponto em que põe em perigo a vida dos outros, e não se importar com isso.

Controlar estas paixões é a maneira para continuar a ser e sentir-se humano; uma vida de imortalidade rapidamente torna a mais sã da pessoas num individuo frio e insensível, por isso, paradoxalmente, os Aetheroplastas alimentam as suas paixões. No entanto, ceder às emoções demasiadas vezes é tornar-se um Arrebatado, e muitas vezes os Aetheroplastas não sabem quando isso acontece.

Em termos mecânicos isto quer dizer que a Regra de Drama deve ser aplicada se o grupo como um todo decidir que o personagem está a ceder demasiadas vezes às suas emoções, e é mais um Arrebatado do que um puro Aetheroplasta. Como sempre, deve ser sugerida uma opção interessante para o jogador que lhe permita escolher continuar a jogar com o seu personagem, que está à beira do abismo, ou deixar-se cair e abraçá-lo, deixando no entanto de poder jogar com ele.

As Chaves Inenarráveis são as que definem o conhecimento maligno do Éter, ou as mutações físicas ou mentais que podem ocorrer devido à sua manipulação.

Por norma, os Aetheroplastas iniciantes não têm Chaves Inenarráveis, mas isso não quer dizer que não as ganhem rapidamente, principalmente se dependerem da Aetheroplastia para ações mundanas.

De cada vez que o Aetheroplasta exercer a sua arte, o jogador escolhe o grau de influência do poder, o que lhe dará um vislumbre do Éter. Este vislumbre afeta a mente do personagem, e às vezes o próprio corpo.

O jogador pode escolher ser um receptor da influência do Éter, na forma de conhecimento sobre a verdadeira natureza do Éter que fica marcado na sua mente, ou de uma mutação física que o torna cada vez mais uma aberração, provavelmente com tentáculos.

Assim, quando pratica Aetheroplastia, o jogador pode escolher:

- uma Chave Mental Mundana Temporária, o personagem ganha uma nova paixão, se o efeito for menor ou de pouca influência
- uma Chave Inenarrável Mundana Permanente, o personagem ganha conhecimento sobre o Éter, ou fica com uma mutação menor, como olhos de cor diferente e extravagante para a sua espécie, escamas ou língua bifurcada, se o efeito tiver um alcance maior
- uma Chave Mental Superior Temporária, o personagem perde momentariamente o controlo, para um efeito mais vasto
- uma Chave Inenarrável Superior Permanente, o personagem ganha uma mutação que o distingue completamente dos demais e é quase impossível de disfarçar, como um tentáculo em vez de um braço, poços de vazio no lugar de olhos, ou voz que ensurdece, ou ganha maior conhecimento sobre o Éter, para um efeito verdadeiramente influente

Ou ainda o jogador pode escolher não ficar com uma nova Chave, o que efetivamente significa que o personagem não ficou de nenhuma maneira alterado pela manipulação do Éter, mas permitiu que este se abrisse e jorrasse para a realidade onde está, alterando-a de uma maneira profunda e permanente, mesmo que o efeito pretendido seja menor; efeitos maiores podem inclusive afetar mais do que uma realidade. Esta é a maneira que os Arautos têm de apressar o fim do mundo e chamar os seres que habitam o Éter.

Sobre o grau dos efeitos irei falar numa próxima publicação, quando falar sobre Aetheroplastia.

Acompanhem-me!